25 de out. de 2010

Lawrence Ferlinghetti



POPULIST MANIFESTO No. 1
Manifesto Populista


Poetas! Deem o fora de seus gabinetes,
abram suas janelas, abram suas portas,
vocês já ficaram muito tempo no fundo
de seus mundos fechados.
Venham, desçam
de suas Colinas Russas e Colinas Telegráficas,
suas Colinas do Farol e suas Colinas da Capela,
seus Montes Analógicos e Montes Parnasos,
desçam de suas colinas e montanhas,
fora de suas tendas e domos.
As árvores são derrubadas
e nós não voltaremos para as florestas.
Não há tempo para ficar sentado
quando o homem queima sua própria casa
para assar seu porco
Nada de cantar Hare Khrishna
enquanto Roma queima.
San Francisco está queimando,
a Moscou de Maiakovski está queimando
os combustíveis-fósseis da vida.
Noite e o Cavalo aproximam-se
devorando luz, calor e poder,
e as nuvens têm calças.
Não há tempo para o artista se esconder
acima, além, debaixo dos cenários,
indiferente, aparando suas unhas,
refinando-se fora da existência.
Não há tempo para os nossos joguinhos literários,
não há tempo para nossas paranóias e hipocondrias,
não há tempo para medo e náusea,
há tempo somente para luz e amor.
Temos sido as melhores mentes de nossa geração
destruídas pelo tédio das leituras poéticas.
Poesia não é uma sociedade secreta,
muito menos um templo.
Palavras secretas e cânticos não interessam.
A hora de profetizar já passou,
o tempo de entusiasmo chegou,
um tempo para entusiasmo e alegria
sobre o vindouro final
da civilização industrial
que é péssima para a Terra e o Homem.
É hora de olhar pra fora
na completa posição de lótus
com olhos bem abertos,
É hora de abrir suas bocas
com um novo discurso aberto,
É hora de comunicar com todos os seres sensíveis,
Todos vocês ‘Poetas das Cidades’
pendurados em museus incluindo a mim mesmo,
Todos vocês poetas de poetas escrevendo poesia
sobre poesia,
Todos vocês poetas de oficinas de poesia
no coração farrista da América
Todos vocês arrombados Ezra Pounds
Todos vocês remotos estanhos excluídos poetas,
Todos vocês estressados poetas do Concreto,
Todos vocês poetas lambedores-de-cu,
Todos vocês poetas de toilete gemendo com grafite,
Todos vocês gigantes de trem classe A que nunca gingam
em vasos de plantas
Todos vocês da serraria nas Sibérias da América,
Todos vocês irrealistas sem-olhos,
Todos vocês auto-ocultados supersurrealistas,
Todos vocês visionários de quarto e agitadores-propagandistas
de gabinete,
Todos vocês poetas Groucho Marxistas
e camaradas da classe-desocupada
que descansam o dia todo e discutem sobre o proletariado,
Todos vocês católicos anarquistas da poesia,
Todos vocês Black Montanhistas da poesia,
Todo vocês bucólicos Brahims e Bolinas de Boston,
Todos vocês mães-reclusas da poesia,
Todos vocês irmãos-zen da poesia,
Todos vocês amantes suicidas da poesia,
Todos vocês cabeludos professores da poesia,
Todos vocês resenhistas de poesia
bebendo o sangue do poeta,
Todos vocês Polícia da Poesia –
Onde estão as selvagens crianças de Whitman,
onde as grandiosas vozes se expressam
com um sentido de doçura e sublimidade,
onde a grandiosa nova visão,
a grandiosa visão-mundial,
a elevada canção profética
da imensa terra
e tudo o que canta nela
e nossa relações com ela ?
Poetas, desçam
para as ruas do mundo outra vez
E abram suas mentes e olhos
com o antigo deleite visual,
limpem suas goelas e falem,
Poesia está morta, vida longa à poesia
com olhos terríveis e força de búfalo.
Não esperem a Revolução
ou que aconteça sem vocês,
Parem de murmurar e falem alto
com uma nova poesia ampla
com um nova comum-sensual ‘superfície pública’
com outros níveis subjetivos
ou outros níveis subversivos,
um afinado garfo no ouvido íntimo
a golpear sob a superfície.
De seus próprios suaves Eus ainda cantam
Ainda completo ‘a palavra em massa’
‘Poesia o comum condutor
para o transporte do público
aos lugares mais elevados
que outras rodas podem conduzir.
Poesia ainda precipita-se dos céus
em nossas ruas ainda livres.
Eles não ergueram as barricadas, ainda,
as ruas ainda vivem com as faces,
amáveis homens e mulheres ainda caminham,
ainda amáveis criaturas por todos os lugares,
nos olhos de todos o segredo de todos
ainda enterrados lá,
as selvagens crianças de Whitman ainda dormem lá,
despertam e caminham livremente.

Trad. Leonardo de Magalhaens
http://leoleituraescrita.blogspot.com

1 de out. de 2010

André Carneiro

QUÂNTICA REALIDADE

Na pequena morte
ressuscito o mundo estranho
da minha cabeça.

Sou o mandarim no sonho da borboleta.
Vivo a irrealidade dos fatos
sem a memória acordada.

Neste próximo milênio
faço 15 bilhões de anos.
Ainda tenho na ponta do dedo
um átomo girando do big-bang.

A cobra,
desesperada
com a falta dos braços,
abraça Eva com o corpo inteiro.

Os avós peixes não se lembram
quando saíram da água.
Não há mais opostos:
real e imaginário,
passado e futuro,
vida e morte.

As palavras caíram
no lago global do esquecimento,
a quântica relatividade dança conosco
no espaço curvo deste planeta redondo.
...

do livro ainda inédito Asas da Sobrevivência