18 de abr. de 2008

Iracema Macedo


Hoje planto nesta querida árvore
mais uma voz da poesia contemporânea
do Rio Grande do Norte: Iracema Macedo.





IDÍLIO


Entre notícias antigas e muralhas
construí com você
um amor feito alucinadamente de palavras
Meus versos seduzem os seus
seus versos aliciam os meus
Coloquei nossos livros juntos na estante
para que se toquem
e se amem clandestinamente
durante as madrugadas


ARDOR

Um oceano inteiro não basta
para calar no meu peito
este murmúrio
de tantas formas de ardor
tantas formas de estar banida e só
e não há terra ou chuva
que arrefeça
esta porção de mim
que trago cálida
esta porção de mim
que trago presa
este meu coração cheio de vespas


AS VESTES

Enfrentei furacões com meus vestidos claros
Quem me vê por aí com esses vestidos
estampados
não imagina as grades, os muros
o chão de cimento que eles tornaram leves
Não se imagina a escuridão
que esses vestidos cobrem
e dentro da escuridão os incêndios que retornam
cada vez que me dispo
cada vez que a nudez me liberta dos seus laços.


BACANTE

Em meu ninho longínquo
inicio ventos
invento cios
canto e danço em volta do fogo
transformo meu leite em vinho
e ofereço meu corpo para os lobos


O RITO DE CARMEM

Ela é uma forma de alucinação
de hino ao perigo
e ao furor
Perfuma-se com um poema
e se apronta
como quem vai ao cinema

Parece que não há riscos
em tudo que ela faz
mas ela acorda e dorme
sitiada
Mulher em que se atira facas
ela recebe os golpes um a um
Arremessos de perda, luxúria, ciúme

No centro do picadeiro
Um homem de olhos vendados
ameaça matá-la
todas as noites
diante dos aplausos inocentes

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Iracema Macedo nasceu em Natal em 27 de junho de 1970. É autora de dois livros de poesia: Lance de dardos, publicado em abril de 2000, e Invenção de Eurídice, publicado em 2004. Defendeu tese de doutorado em filosofia na Unicamp com o tema “Nietzsche, Wagner e a época trágica dos gregos”. Atualmente leciona Filosofia na Universidade Federal de Minas Gerais.