Só depois é que veio o delírio do verbo.
O delírio do verbo estava no começo, lá, onde a criança diz:
eu escuto a cor dos passarinhos.
A criança não sabe que o verbo escutar não
Funciona para cor, mas para som.
Então se a criança muda a função de um verbo, ele delira.
E pois.
Em poesia que é voz de poeta,
que é a voz
De fazer nascimentos -
O verbo tem que pegar delírio.”
Ler Manoel de Barros é um convite ao prazer constante com o susto provocado pelo uso insólito da palavra. O primitivo, o nada, o ínfimo são os substratos constantes da sua construção poética. O estranhamento diante do universo reinventado por ele nos torna, de alguma forma, co-autores da sua poesia. Desnomeando, Manoel de Barros não resignifica a palavra, mas a liberta de um pressuposto. “Desaprender oito horas por dia ensina os princípios”. Desaprender desafia o abandono de um prévio saber para encontrar a essência do desconhecido.Cabe ao poeta a transgressão. Cabe ao poeta não apontar o delírio, mas despertá-lo. Manoel Wenceslau Leite de Barros, nascido no Beco da Marinha em Cuiabá/MT em 1916, diz no prefácio do seu Livro Sobre Nada: “O que eu queria era fazer brinquedos com as palavras. Fazer coisas desúteis. O nada mesmo. Tudo que use o abandono por dentro e por fora”. É Manoel de Barros este fazedor de verbo delirar, burilador das emoções em seu nascedouro.

"Escrevo o idioleto manoelês archaico (Idioleto é o dialeto que os idiotas usam para falar com as paredes e com as moscas). Preciso de atrapalhar as significâncias. O despropósito é mais saudável do que o solene. (Para limpar das palavras alguma solenidade _ uso bosta.) Sou muito higiênico. E pois. O que ponho de cerebral nos meus escritos é apenas uma vigilância pra não cai na tentação de me achar menos tolo que os outros. Sou bem conceituado para parvo. Disso forneço certidão."
P. S.: "Só a alma atormentada pode trazer para a voz um formato de pássaro. Arte não tem pensa: O olho vê, a lembrança revê, e a imaginação transvê. É preciso transver o mundo. Isso seja: Deus deu a forma. Os artistas desformam. É preciso desformar o mundo: Tirar da natureza as naturalidades". (MB).
Meu carinho agradecido a Cla e a Val que me permitiram este momento de transver o mundo por meio de Manoel de Barros.

fontes:
http://www.releituras.com/manoeldebarros_bio.asp
http://www.revista.agulha.nom.br/manu.html#bio
http://www.redutoliterario.hpg.ig.com.br/poesia/manoeldebarros.htm
texto: Lela Vasconcellos
arte: Valéria C.


